23.12.18

Poema de Natal (2018/1964)

podem não gostar
mas nós vamos lutar
todo santo dia
ainda que não
acreditemos
em santos
ou na virgem
maria
somos joãos
somos pedros
somos luzias
somos enfermos
sãos
sebastiãos
nesse inferno
brasil
das covardias
podem não gostar
mas nós vamos lutar
ainda que o diabo
sorria
somos viados
putas
pobres
negros
mulheres
almas vazias
aquela gente
que morre
todo dia
sem merecer
seu olhar
sua piedade
sua poesia
podem não gostar
vocês nunca
gostaram mesmo
mas
um dia
vai chegar
nossa hora
e aí
será
demasia.

22.12.18

Dupla atroz

de fujão
e de ladrão
cada um
tem um pouco
só não vê
quem não quer
ou não dá tino
ao coco
cadê o queiroz?
cadê esse moço?
foi chupar
laranja
e os bagos
do bolso.


Despejo

queria fazer
um poema
que não 
levasse
raiva
revolta
revolução
mas
levem a mal
não
antes de poetar
nunca
lavo as mãos.

13.12.18

Brazil, paus e pedradas

meu brasil
do pau
do pé
de goiaba
da laranja
fardada
da verdade
favelada
da pobreza
arrombada
meu brasil
do pau
da piroca
da pica
toda
enfiada
no cu
dessa gente
que finge
que deus
é pai
só pra
aguentar
a porrada
nossa
de cada
dia
até que
a morte
nos una
na última
cagada.

30.11.18

Parças

se a parada
é tosca
chama eles
seu parças
parceiros
chegam
falando alto
bando
trupe
gangue
de guerreiros
se o trampo
é fosco
berra neles
seus parças
parceiros
brigam
no asfalto
povo
time
tropa
de fuleiros
tumulto?
invasão?
revolução?
conto com eles
camaradas
companheiros.

11.11.18

Uber

somos super
uper
hiper
modernos
não fosse
o fato
de morrer
e não
sermos
assim tão
eternos
saberíamos
que não existem
verões sem
infernos.

6.11.18

Brasil, amo e não deixo

amo
os fodidos
os oprimidos
os que nunca falam
os que não são ouvidos
amo
os fracos
os degenerados
os deixados à margem
os exterminados sem abrigo
não deixo
os poderosos
os injustamente ricos
dizerem
o que devo e onde fico
não deixo
os foderosos
os falsamente lícitos
mandarem
o que digo e repito
Brasil
amo
não deixo
e vocês
fascistas
vão ter que me engolir
vivo.

29.10.18

Estrela

quando
o ódio
vence
a esperança
até parece
que o mal
cresce e
avança
pare
pense
tenha confiança
nossa fome
de justiça
só aumenta
enquanto eles
enebriados
de vinho
e vitória
enchem
as ruas
as praças
a pança
quando
o ódio
vence
a esperança
não perece
aquela estrela
que brilha
além de onde
a vista
alcança.

7.10.18

AMANHÃ

sou negro
sou viado
sou mulher
sou sapatão
sou
seu pesadelo
sua excomunhão
sou campo
sou cidade
sou favela
sou exclusão
seu tormento
sua preocupação
você pensa
que passa
mas
não passará
nem passarão
vai dormir
fascista
que amanhã
tem
revolução.

6.10.18

Livres para lutar

a liberdade
incomoda
falta ao trabalho
faz greve
tira folga
a liberdade
é folgada
nega o dogma
abusa
usa droga
a liberdade
é sagrada
não obedece
se atreve
vai embora
a liberdade
é nossa
e ninguém
apagará
nossa calma.

1.10.18

Elenismo

ele não
ele nunca
ele jamais
ele nem
merecia
tanta
atenção
pois ele
tão
minúsculo
só seduz
quem por
falta
de escrúpulo
confunde
problema com solução.

Boçal

ele fala merda
ele fala mal
ele fala?
rosna
bufa
peida
como é natural
ele fala merda
ele fala mal
ele fala?
grasna
ruge
engasga
como é boçal
ele não tem
bossa
roça
nem capinzal
é capitão
do mato
sem cachorro
no esgoto
moral.

26.8.18

AdVinho

não sei
se o frio
traz o vinho
ou o vinho
traz o frio
só sei
que eu
adivinho
seu
coração
todinho.


Lua e fios

a lua
entre fios
à luz do dia
é tão sem poesia
talvez por brilhar menos
sombria
a desejar
desejos
sombras
e água fria.

24.7.18

Dá-me um cutelo

que o nosso amor
deve ser
cortado
à faca
você me diz
corno
eu te digo
vaca
me dá uma faca
antes
que nos dê
tesão
e a raiva
se desfaça.

19.6.18

Problema circulatório

corre
em minhas veias
um mar vermelho
de esperanças
inúteis
circulam boatos
no meu organismo
de que todos
os sonhos
são fúteis.

19.5.18

Um pé atrás

espreito
minhas dores
como 
se fossem
menores
que as dos outros
todos
desconfiados
se fazem de idiotas
só pra desconfiar
das próprias
derrotas.

16.4.18

Sereias

atiro palavras
ao mar
feito garrafas
e há quem use
chamar
de poesia
essa simples
maresia
mania
de tentar
pescar
sentido
em estar
afogado
no raso
lugar que fica
entre o ar
e a sereia.

22.3.18

Seu lúcido

faz tempo
que não tenho
um soluço
isso é estranho
me sinto
confuso
será que estou vivo?
será que sou lúcido?
faz tempo
que não tenho
um soluço
temo não ser
mais humano
temo não ser
mais americano
temo
tremo
me esgano
faz tempo
que não tenho
um soluço
morri
e não
percebi
que sou russo.

7.3.18

Dilema

entre um mapa astral
e outro
disfarço
e faço
um poema
não tema
cada um
desfaz da morte
que ali
acena
como se fosse
nosso
esse roteiro
cheio de estrelas
de cinema.


14.2.18

Cinzas

de um cigarro
de um amor
de um sem cor
restos
de uma espera
de uma paixão
desilusão
vamos
dobrar a esquina
da rua torta
que corta
essa avenida coração.

27.1.18

26.1.18

A tristeza errada

certas tristezas
não levam
a nada:
água parada
paixão perdida
na estrada
mas há outras
que atravessam
minha garganta
feito facada:
aquela criança
magra
caixa de balas:
olhar perdido
olhos de vidro
na calçada.

15.1.18

Fingimento

coisa mais tosca
é essa de a gente
se viver sendo inútil
acordar sorumbático
dormir pragmático
sentir todas as doenças
num só corpo
inútil
fútil
se era para ir era melhor nem ter vindo
o melhor do sonho
é se fingir
dormindo.

8.1.18

Verão

a chuva
é sentimento
que escorre 
por fora
do vidro
embaçado
desse
automóvel
modelo coração
quanto mais chove
mais acelero
rumo
ao
cruzamento
de uma nova
avenida
com a imaginação.

5.1.18

Cadeirada

Todo mundo fala do jeito que vemos as coisas mas pouco se comenta de como as coisas nos vêem. Uma cadeira, por exemplo...
cá estou eu
aqui parada
quatro pernas
e não posso andar
sirvo para tudo
sirvo para nada
tenho mesmo
que te esperar
aqui sentada?


Reflexos

 reflito meu futuro com o olhar do passado sei que morro sei que lagoa sou sujeito à toa que a morte zoa.